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[Crónica] Festival da Canção 2018 (1ª semifinal): "Boa m****"


Oito horas da noite e lá estávamos nós – imprensa, amigos dos artistas, convidados, técnicos, apresentadores, artistas, mais artistas... E afins –, no estúdio 1 da Rádio e Televisão de Portugal (RTP), à espera dos oito minutos das nove da noite, hora a que, finalmente, ou não, as televisões dos portugueses foram brindadas com a primeira semifinal da 50ª edição do Festival da Canção.

"Boa merda!", gritou alguém do backstage para Jorge Gabriel. E este retribuiu. "Boa merda"... "Boa merda" foi o mote.

Após a habitual introdução e após recordarmos a egrégia e eterna Madalena Iglésias, lá entraram Jorge Gabriel e José Carlos Malato e lá demos as boas vindas a Inês Lopes Gonçalves, que foi despromovida a apresentadora de green room e promovida a apresentadora de green room (é como quiserem). Olá júri, olá Isidro, adeus Isidro. Luísa! E começou finalmente o desfile das 13 canções.

Olhei para o lado e estava tudo com um ar aborrecido, mas era preciso manter a postura porque: 1) estávamos mesmo atrás do palco e dava mau aspecto estar feito animal invertebrado, de corpo todo curvado; 2) cantava o primeiro intérprete... Não fosse ele mandar-nos para a Austrália num estalar de dedos.



Conversa para ali, conversa para acolá, porque encher chouriços é uma coisa típica dos portugueses, lá iam os assistentes de produção preparando o palco para a atuação que se seguia. Nem foi preciso olhar para o teleponto para perceber que vinha aí a Anabela. "Não há intervalo a meio das atuações?", balbuciei para o lado, na esperança que surgisse um sim, mas o senhor à minha esquerda continuou com os olhos colados ao telemóvel.

"Os backing vocals são os mesmos em todas as atuações", pensei, enquanto me encantava com a entrada da Joana Espadinha. "As roupas combinam e tudo". Foi a maior surpresa da noite, tendo em conta os 45 segundos oferecidos no início da semana. 

"Um amplificador? Só pode ser para o Janeiro!" Aparentemente a virtude está mesmo no meio. Janeiro entrou (com roupa de mecânico, mas ninguém quis saber disso), a luz apagou e a magia entrou no estúdio da RTP. Olhei para os lados: os mais aborrecidos até tinham ganho outra cor e não havia ninguém a mexer no gadget de bolso. 



Durante a VT do José Cid várias pessoas do público esboçaram sorrisos... Se era ironia ou pura realidade não deu para entender... O Cid não agrada a toda a gente, já se sabe. Tal é a surpresa quando olho para a frente e me apercebo que há mais para além do característico piano. Obrigada José Cid.

Não desvalorizando as atuações que haviam passado, aliás, valorizar, a negrito e tudo, a grande voz do Peu Madureira, que conseguiu por todo o estúdio em ordem, mas o melhor ficou mesmo para o fim! O melhor do pior. JP Simões deixou toda a gente num tremendo alvoroço; "não estou a aguentar estas luzes", comentei, quando até os bancos, uma espécie de pedra forrada com papel espuma, tremiam por todo o lado. O nome da canção tinha ganho vida. 

Maria Amaral e a sua voz doce entraram em palco e desiludiram todos os que estavam ao meu lado. "Não acredito", comentaram comigo, logo após Maria Amaral se descair. Foi a última canção e já estava tudo sem postura.



Durante o intervalo, a vida no estúdio não parou, José Carlos Malato aproveitou para fumar, Jorge Gabriel apoveitou para cantarolar e dançar, e eu, como todos os outros, aproveitei para esticar as pernas e as costas. Já haviam passadas duas horas. "Faltam quatro minutos!", gritou alguém da produção. Tudo a correr para os lugares, para não perder o restante espetáculo. "Ainda vão passar a VT das canções e ligar à green room", diz o senhor ao meu lado, descontraído, enquanto escreve um post para o Twitter; aproveitei também para pôr as redes sociais em dia. 

Não podiam faltar as homenagens a Carlos Paião... "Bons tempos", pensei enquanto cantarolava "Vinho do Porto"; e logo de seguida mais uns minutinhos de intervalo. Mas aquele intervalo foi diferente... Ninguém queria sair do estúdio... Já estávamos todos em pulgas para saber as votações. Ao início da última meia hora, ainda nos rimos todos um bocadinho, até Malato e Jorge Gabriel, quando ouvimos Fernando Tordo a responder "é porque isto é muito divertido", com cara trancada. Até coloquei o telemóvel de lado para ouvir atentamente o resto da entrevista...

"Também eu queria água fresca", lamentei enquanto ouvia Dina e observava o Júlio Isidro a deslocar-se com os votos na mão. 


"Expectável", pensei ao ver a votação do júri. Foi uma votação íntegra e justa, das mais justas que me lembro, mas fiquei com pena da Rita Dias... Merecia pontuação. 

Soltei umas boas asneiradas enquanto ouvia, e via no ecrã led atrás de mim, as pontuações do televoto; soltei eu e soltou imensa gente que estava ao meu lado. O estúdio todo sussurrava; todos ansiosos por saber quais os sete magníficos.

Desilusões e surpresas à parte, a VT dos sete mais votados passou, os artistas finalistas e a Inês Lopes Gonçalves entraram no estúdio e eu levantei-me, discretamente, pois sabia que a emissão ainda estava no ar.

Saltei para o palco à procura de artistas para congratular, mas estavam todos a dar entrevistas. Todos queriam falar com os grandes. "Parabéns, grande apresentação!", disse, dirigindo-me a Jorge Gabriel.

Sensação de dever cumprido era o que via em todas as caras; sensação de dever cumprido era o que eu queria que vissem na minha cara. "Boa merda", lembrei-me, já à saída dos estúdios da RTP. Foi assim que se começou esta semifinal e é assim que quero terminar a minha reflexão, porque nem sempre a palavra "merda" é grosseira e tem sentido negativo.


"Boa merda".

Esta crónica está disponível numa versão áudio, acompanhada por um vídeo que mostra a vida no estúdio da RTP durante o Festival da Canção. Ouça a crónica no vídeo que se segue.


Imagens: RTP; Lux

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