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[Crónica] Portugal na Eurovisão: "E Depois do Adeus" de Paulo de Carvalho (1974)


A 6 de Abril de 1974 aconteceu o 19º Festival Eurovisão da Canção. O evento foi acolhido pelo Reino Unido, após a recusa do Luxemburgo de realizar o festival pelo segundo ano consecutivo, sendo o local escolhido a cidade de Brighton. Assim, o Reino Unido mostrou, pela quinta vez, que sabe realmente organizar o maior festival de música, a nível europeu. O número de participantes foi 17. A França não esteve presente no festival porque, naquela semana, morreu o presidente francês Georges Pompidou. O seu lugar foi “ocupado” por um dos países que, nos últimos anos, tem tido o maior sucesso no mundo eurovisivo – a Grécia. 

O agora conhecido Festival RTP da Canção daquele ano (que até à data de 1975 seria denominado de Grande Prémio TV da Canção Portuguesa) foi ganho por Paulo de Carvalho e a sua música “E Depois Do Adeus”, conseguindo portanto o direito de nos representar em Brighton. 

O cantor apresentou-se vocalmente bem durante toda a interpretação, sendo de referir que a sua maravilhosa voz alcançou o ponto alto, precisamente na parte final da actuação. Aquilo arrepia! 

A música, da autoria de José Calvário, é a típica balada que ainda hoje está presente todos os anos no festival, não deixando de ser agradável. Penso que o que limitava um pouco os festivais da época e que contribuía para que, por vezes, as músicas “irritassem” era o facto de a música ser tocada ao vivo por uma orquestra. O som dos instrumentos, em certas alturas, abafava a voz do cantor, impedindo que o ouvinte (independentemente de ser português ou não) entenda o que se diz. 

O ponto alto da nossa apresentação era a letra (aliada a uma boa música), que acabou por quase não passar para o público. Foi nesta magnífica letra que José Niza apostou naquele ano, na tentativa de alcançarmos um bom lugar. Mas pelos vistos, o júri voltou novamente a ignorar o nosso esforço e desprezar propostas com qualidade. O tema central da letra é o amor, em que Paulo se põe no lugar de um homem que vê chegar o fim do seu relacionamento amoroso. Para mim, a parte mais bonita é quando o cantor diz “Em Silêncio, amor/Em tristeza e fim/Eu te sinto, em flor/Eu te sofro em mim”. O cantor pergunta-se, logo no início, o porquê de ter sido abandonado, acabando no entanto por reconhecer que o seu relacionamento foi muito curto: “Tu vieste em flor/Eu te desfolhei”. Ao mesmo tempo, surge o arrependimento porque a mulher amada se deu “em amor” e ele nada lhe deu em troca. A angústia e o sofrimento dominam toda a letra, sendo o maior medo do cantor o facto de, após dizerem adeus um ao outro, ficarem cada um para seu lado e, portanto, sós no mundo. 

Contudo, e apesar da boa prestação de Paulo de Carvalho, o resultado final não foi o mais satisfatório. Portugal classificou-se em último lugar juntamente com a Alemanha, Suíça e Noruega, obtendo um total de apenas 3 pontos. A vitória coube à Suécia (com 24 pontos) que levou a canção “Waterloo” interpretada pelo grupo ABBA. A fama mundial que este grupo alcançou foi posterior à sua participação no ESC. Até então eram praticamente desconhecidos. 

Contrariamente a alguns dos anos anteriores, a letra deste ano não tinha carácter político, o que não deixa de ter a sua piada, pois esta música/letra foi a que mais esteve implicada directamente na situação política do país. Para quem não sabe, esta música foi a 1ª senha que, posteriormente, levou à queda do regime salazarista no dia 25 de Abril de 1974. Ao ouvirem a música na rádio, os tropas do Movimento das Forças Armadas souberam que a revolução estava em curso e que podiam seguir em frente, acabando por derrubar o regime. O facto de ter sido escolhida esta música para dar inicio à Revolução dos Cravos é óbvia: não tendo carácter político, o regime não poderia desconfiar dos planos do MFA. Como tinha participado no ESC de 74, era habitual ouvir-se nas rádios portuguesas.

Esta música ficou famosa, não tanto pela sua participação na Eurovisão, mas por ter sido o sinal que nos libertou da opressão em que vivemos durante 41 anos. Pessoalmente não foi das participações que mais me agradou, mas não deixa de ser uma boa música e só por isso já valeu a pena o esforço.

Escrito por Armando Sousa, 22/06/2011

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