“Vira o disco e toca o mesmo” – este deveria ser o mote do Festival da Canção (FC) 2015. É verdade que se notaram algumas mudanças nos estilos musicais apresentados, mas, no fundo, pouco mudou em termos de qualidade. Fado, saudade, guitarras portuguesas, Tejo, Lisboa, mar… Parece que este Festival se tornou numa amostra do que representa a nação lusa. Tudo bem, somos portugueses, temos coisas boas, mas será que isso é assim tão relevante para os estrangeiros? Será que eles querem saber assim tanto do nosso Fado? Será que eles apreciam músicas com lições de geografia portuguesa? Não me parece.
Poucos foram os meus rasgos de felicidade neste Festival, pelo que esta crónica não é propriamente um elogio à RTP e ao trabalho que se fez neste FC. Gostei de poucos temas, mas não acredito que nenhum deles tenha o que é necessário para sobressair em palcos europeus. Mais uma vez se provou que Portugal tem ótimos intérpretes, mas parece que os compositores não querem usar isso a seu favor. Será que são os intérpretes que estão numa crise criativa (todos?!), ou será que este é um requisito da RTP?
É verdade, meus caros, o meu tema favorito acabou por vencer o certame… Mas no meio de tanta coisa mal feita, nem isso me fez pular de alegria (limitei-me a esbracejar de contentamento). O tema da jovem e talentosa Leonor Andrade, da autoria do conhecido Miguel Gameiro, acabou por se sagrar vencedor, funcionando, quase, como uma vitória caseira dada a participação da intérprete numa das novelas da RTP – não estou a insinuar nada, apenas a constatar um facto que poderá ter influenciado o televoto, dada a popularidade da cantora. Se acho que é um bom tema? Sim, é uma boa amostra daquilo que se consome a nível nacional, com um “cheirinho” a Amor Electro. Se é “material” eurovisivo? Duvido! Mesmo assim, sinto-me dignamente representada, coisa que não acontecia há muito tempo.
Para que as coisas funcionem bem na Eurovisão, o tema precisa de algumas alterações: mais força no instrumental, um coro mais poderoso, uma interpretação mais expressiva e, claro, elementos cénicos que o tornem mais apelativo (fumo, jogos de luzes, máquina de vento, cenário de fundo mais cativante, indumentária mais arrojada…). Precisamos de mudanças, e acredito que a equipa responsável pelo tema é capaz de as fazer, mas será que a RTP aceita? Quanto a uma interpretação bilíngue do tema, isso seria interessante, mas nem vale a pena “bater a essa porta”, não é? Não esquecer que na Eurovisão devemos mostrar quem somos, mas partindo sempre de uma partilha cultural… Há que saber espalhar a mensagem!
Quanto aos restantes temas, contámos com alguns (vários, até!) regressos. José Cid como letrista do também repetente Gonçalo Tavares. Este foi, claramente, a constante escolha dos compositores como opção estratégica… Se tivessem de correr os 100 metros contra alguém, quem escolheriam: o Usain Bolt ou o Sr. Zé com 78 anos e sem uma perna? Em resumo, um tema sem magia, ou nexo.
Cinquenta anos após a sua primeira vitória, Simone de Oliveira considerou que esta era uma altura apropriada para regressar... É uma Diva, mas também é humana e os efeitos do tempo são inevitáveis. Tomei a sua interpretação como uma auto-homenagem, com a declamação de um bonito poema que teve um subtil instrumental de fundo.
De todos os regressos, os menos bem-sucedidos foram os de Adelaide Ferreira e Sara Tavares. Cada uma em seu estilo, e com as suas funções, nenhuma conseguiu surpreender. Ok, Adelaide até surpreendeu, mas pelo carácter aflitivo da música – não tinha mesmo salvação!
Teresa Radamanto também regressou, e quase venceu – acredito que tenha sido o seu segundo lugar, após o de 2007. De todos, foi o tema mais pensado para Viena. Embora o conceito estivesse engraçado, a música acabou por se tornar repetitiva e pouco marcante. O seu ponto mais positivo foi mesmo a interpretação de Teresa.
FC sem Feist não é FC! Voltaram, tiveram destaque, mas falharam na reta final. Interpretação brilhante, marcante, cheia de simbolismo (qual Primavera, qual quê), mas o instrumental voltou a desiludir – precisava de mais poder, e esse poder não pode vir só da interpretação. Se Yola vencesse o FC, não ficaria de todo mal entregue, no entanto, não acredito que tivesse mais hipóteses de sucesso do que a Leonor.
Um último destaque para os temas de José Freitas e Filipe Gonçalves, que procuraram mudar o estilo “meloso” do nosso FC – um com mais qualidade do que o outro. Mais ainda, é bom ver compositores de 21 anos (Churky) a escrever boa música, e a querer investir neste nosso velho Festival. No entanto, a “Joana” não dançou e este não foi, de facto, um “mal menor”.
Em termos mais específicos do espetáculo: fraca produção, fraco palco, fraco investimento. É verdade que falaram mais do FC nos outros programas da RTP, mas para quê tanto alarido? Para ver espetáculos minúsculos (e não me refiro só à qualidade, seis músicas é pouco!), nem sempre bem apresentados (o "Hallelujah" mudou de ritmo, os seios da apresentadora foram mais falados que as músicas, e o FC teve início em 1967), com um palco feio e pequeno, com planos de câmara desprovidos de razão e com muitos tempos mortos. Ponto positivo para as atuações de Lúcia Moniz (que saudades!), Paulo de Carvalho e filho (Agir). Quanto às atuações complementares dos intérpretes… Bah, mais do mesmo!
Resumindo, o alarido aumentou, a expectativa dos mais crédulos também, mas a qualidade permaneceu a mesma. Força Leonor, força Portugal, encontramo-nos em maio… Com pouca expectativa, mas com o orgulho de uma nação sem pimba!
Vídeo: Tiagobatista39
10/03/2015
Depois da crónica boazinha de ontem, temos aqui verdades cruas! Haja liberdade de expressão.
ResponderEliminarLeonor! Eu acredito!
ResponderEliminarPara voces tambem nada presta... muito fez a rtp!
ResponderEliminarSentido de humor muito apurado! E como já alguém disse: a verdade crua.
ResponderEliminarQuanto à produção da rtp, achei muito fraca, um palco/espaço minúsculo (tenho salas de aula maiores do que aquilo) e planos de câmara completamente despropositados.