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[Crónica] Primeira Semifinal do Festival da Canção 2019 e o Painel de Jurados de 1964


O Festival da  Canção (FC) 2019 deu o pontapé de saída no passado dia 16 de fevereiro e, como é habitual, houve surpresas, desilusões, nervos e... polémica nos resultados.

As Atuações

A primeira canção a abrir a primeira semifinal do FC 2019 foi "Inércia", interpretada pela artística Ana Cláudia e composta pelos D'Alva. Este tema cativou-me desde o momento em que o ouvi em janeiro, pela sua excentricidade, pela produção desconcertante e envolvente e pela emoção transmitida pela voz de Ana Cláudia. Não imaginava, no entanto, uma apresentação em palco capaz de transmitir os sentimentos da canção. As dúvidas rapidamente se dissiparam após a atuação digna de Ana Cláudia. Sinceramente, não poderia ter sido melhor. Ana tem uma graciosidade na voz e nos seus movimentos capaz de nos deixar atentos durante toda a atuação. O jogo de luzes e as projeções foram adequadas e o prémio dos melhores planos de câmara vai mesmo para "Inércia".


No alinhamento, seguiu-se "É o que é", canção dos D.A.M.A. e de Francisco Clode, cantada por João Campos. E se, por um lado, "Inércia" foi a surpresa da noite, "É o que é" deixou apenas desilusão para os fãs do tema. A voz de João Campos, em alguns momentos, soa insegura e forçada, tendo deitado por terra as chances desta boa canção ser ouvida em Portimão. Os D.A.M.A. já nos habituaram a um baixo campo lexical nas suas letras, mas teriam feito um melhor trabalho na semifinal.


Após a desilusão da noite, Soraia Tavares fez-se ouvir com o tema "O Meu Sonho" da autoria de Lura. Antes de mais... coros fora do palco? Isto aconteceu mesmo?  Salvador Sobral deve ter mudado de canal na hora... isto se ele estivesse a ver o festival que lhe deu uma carreira, o que não deve ter acontecido. Bem, Soraia Tavares é muito segura vocalmente e sabe estar em palco. O vestido rosa apresentava uma cauda enorme, mais tarde retirada por dois dançarinos em tronco nu. A canção começa bem. Mas acaba  perdida, como um texto sem conclusão. 


Os Calema, autores e intérpretes da canção "A Dois", considerados por muitos os favoritos a ir à Eurovisão, vieram de seguida, com uma atuação morna. A canção não é fruto de um momento de grande inspiração, mas é bastante radiofónica. A nível vocal, foi demasiada informação, a canção não respira e raramente se ouve apenas o instrumental. O coro foi desnecessário e só contribuiu para mais confusão em palco. Houve algumas desafinações e falta de harmonia entre tantas vozes. No entanto, não deixa de ser uma boa canção de rádio, mas que não terá um grande futuro na Eurovisão, caso vença o FC 2019.


Após três prestações pouco conseguidas, eis que chega o grande momento da semifinal. Conan Osíris, autor e intérprete de "Telemóveis", fez elevar a fasquia. Porque é que o Conan foi o melhor da noite? Porque não teve medo de apresentar algo diferente e excêntrico, manteve-se fiel ao seu estilo e ao seu modo de estar em palco, porque foi acompanhado por um dançarino maravilhoso e quebradiço e porque fez com que os gemidos que se ouvem na versão áudio fosse reproduzidos ao vivo (!). Conan é arte e conceito dos pés à cabeça. Qual o significado da letra? E do adereço dourado? E para quê uma escadaria em palco? Demasiadas questões! Entretenham-se a fazer as vossas próprias interpretações e a apreciar o facto de haver um artista como o Conan no FC. Caso seja ele o nosso representante de Portugal na Eurovisão, tudo pode acontecer e ninguém ficará indiferente.


A ingratidão de vir a seguir ao Conan coube a Ela Limão, com a canção "Mais brilhante que mil sóis", composta por Flak. A canção não é propriamente interessante, embora Ela Limão cante num registo que eu gosto. Não há muito a acontecer em palco, como já era de esperar e não conseguiu sobressair no meio das oito canções. Na realidade tive de ver novamente a atuação, porque simplesmente não me recordava dela. 


Quase no fim do alinhamento, veio Filipe Keil, intérprete e autor do tema "Hoje". Eu sempre achei o tema monótono, apesar de o achar razoável. Relativamente à prestação em palco, tenho a dizer que, simplesmente, não gostei. Não houve um fio condutor, foi tudo apresentado com algum amadorismo e os planos de câmara da RTP também foram medíocres.


Finalmente, chegamos a "Perfeito", canção cantada por Matay e composta por Tiago Machado. A canção foi apresentada com sobriedade, tal como o bom tema que é ouvido. Há que ressalvar que, ao vivo, o tema perdeu alguma força e magia da versão áudio, mas a voz de Matay é realmente maravilhosa. Acho, no entanto, que a apresentação poderia ter sido executada com mais classe, com outro figurino e jogo de luzes. Caso seja o Matay o vencedor do FC 2019, prevejo dificuldades em chegar à final da Eurovisão. O tema é bom, mas pouco memorável à primeira audição e não é nada que a Europa já não tenha ouvido.


  O Espetáculo

A primeira semifinal do FC 2019 foi a típica emissão a que estamos já habituados. Como aspeto bastante positivo ressalvo o ritmo com que foram apresentadas as canções, tornando a primeira parte do espetáculo entusiasmante. Ponto positivo também para os vídeos de apresentação dos artistas, que foram gravados e trabalhados com grande profissionalismo e, por fim, para o design moderno.


Mas como nem tudo é um mar de rosas, continuo a achar a segunda parte do programa demasiado extensa, sempre com o mesmo tipo de apresentações e tributos da idade da pedra. As apresentadoras (Tânia e Sónia) levam também nota negativa, por não serem minimamente divertidas e parecerem estar a apresentar um programa da manhã. Para uma estação de televisão que já organizou uma maravilhosa edição da Eurovisão, deve-se exigir mais e uma melhor noção de entretenimento.

Os Resultados



Verdade seja dita, as quatro melhores apresentações foram de facto as que transitaram para a final. Mas repare-se com atenção nos resultados dos votos do estimado e adorado painel de jurados do FC 2019, responsáveis por 50% dos resultados finais:

1º Matay (12 pontos)
2º Calema (10 pontos)
3º Ana Cláudia (8 pontos)
4º Conan Osíris (7 pontos)
5º João Campos (6 pontos)
6º Ela Limão (5 pontos)
7º Filipe Keil (4 pontos)
8º Soraia Tavares (3 pontos)

O tiro foi certeiro ao escolherem para finalistas (destacados a negrito) os melhores da noite. Mas a atribuição dos pontos aos quatro eleitos é absolutamente sem sentido e apenas demonstra aquilo que já todos sabemos: o painel de jurados não faz ideia nenhuma do que está a fazer. E de nada adianta vir com a história de que foram eles que escolheram o Salvador para a Eurovisão, porque nesse ano, a melhor canção era realmente "Amar Pelos Dois", pelo que não fizeram mais do que a sua obrigação ao terem-na elegido. Agora Matay com 12 pontos? Calema com 10 pontos, tendo ficado à frente dos maravilhosos Conan e Ana  Cláudia? A prestação do Matay foi boa, mas a sua canção pouco memorável terá algum resultado na Eurovisão? Não estarão eles a votar em "Perfeito" simplesmente porque não há vestígios de música eletrónica na canção? Saberá Julío Isidro o que é música eletrónica? Calema, com uma canção extremamente genérica, sem qualquer hipótese de vingar na Eurovisão, merecem mesmo 10 pontos? Mais uma vez, demasiadas questões, mas estas sim, precisam rapidamente de uma resposta.


O painel de jurados precisa rapidamente de ser reformulado e Júlio Isidro, por mais respeito que tenha pelo grande senhor da televisão, precisa de passar a assistir ao FC em casa. Achei vergonhoso o Júlio ter dito, a certo momento da emissão, que as canções eram boas mas que nenhuma o tinha feito chorar até então. O que ele quererá dizer com tal disparate? Que apenas as canções que façam o público chorar merecem ganhar o FC? Então, uma canção dançável não poderá ser tão boa quanto uma balada? Espero sinceramente que, na final, haja mais decência pelo painel de jurados regionais.

O público acabou, no final, por dar os merecidos 12 pontos ao Conan, embora tenha ficado desiludido com os 5 pontos atribuídos a Ana Cláudia. Talvez o facto de "Inércia" ter sido apresentada em primeiro lugar tenha  prejudicado o resultado final e a recetividade do público tenha sido baixa.


Tendo em conta a opinião do painel de jurados e do público, os finalistas foram Matay, Conan, Calema e Ana Cláudia, resultados justos, a meu ver.

E finalmente...

É notório que a  RTP se esforça cada vez mais em entregar um festival de qualidade e variado. Arrisco-me a dizer que o conjunto de canções deste ano é um dos melhores de sempre. Agora, é necessário dar ainda largos passos, nomeadamente a nível da realização, das atuações e do painel de jurados. Claro que a RTP irá apostar mais na emissão da grande final do festival, mas há simples aspetos que se podem melhorar nas semifinais, como o tipo de "enche chouriços" que se apresenta normalmente na segunda parte das semifinais, na escolha dos apresentadores...

A RTP tem aprendido muito com os erros e espero que, para o ano, se assista a uma semifinal mais ao nível daquilo que a estação nos apresentou na Eurovisão, obviamente com as devidas adaptações. 

Principais  Distinções da Noite

Melhor Prestação

Conan  Osíris


Maior Surpresa

Ana Cláudia


Pior Prestação

Filipe Keil


Imagens: msn, festivais da canção, lux, a televisão, RTP

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