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[Crónica] A ingratidão dos "Triunfos" espanhóis


Espanha, o que fazemos com vocês?

Chegou a altura dos nossos melhores (e únicos) vizinhos escolherem qual é canção que representará o país das sestas da hora de almoço, canção esta que será inevitavelmente sobrestimada na capacidade de alcançar os primeiros 20 lugares da tabela da final da Eurovisão pelos espanhóis.

Dissemos adeus ao totalmente eficaz, nada-dramático, Objetivo Eurovisión (saudades de ver a Segunda Guerra Civil Espanhola em direto!) e acolhemos o maior sucesso da televisão espanhola como final nacional: a Operación Triunfo

Porque é que a Operación Triunfo poderia ser o programa ideal para escolher o representante espanhol? A gala da Eurovisão da Operación Triunfo em nada se assemelha ao Objetivo Eurovisión. Os espanhóis, a este ponto, acompanharam o percurso de dezasseis  millennials que nada sabiam sobre música e que, no final do seu percurso numa academia de música, são melhores performers do que qualquer outro participante de um programa rival (e de muitos artistas consagrados!). 

Nada poderia correr mal, certo? 

"Camina! Da un paso al frente y dramatiza!"

Em 2017, foi-nos apresentado, para a final nacional espanhola, um mix de canções medíocres, de cinco finalistas que nada sabiam sobre a Eurovisão e de pouco interesse da parte de todos envolvidos (até do homem responsável pelas luzes). No final, correu tudo bem. Os espanhóis escolheram a canção menos medíocre, escolheram uma narrativa e, atrevo-me a dizer, escolheram uma boa representação para o país (mesmo que tenham sido um flop tão grande, madre mía!).

Chega 2018 e o cenário está mais esperançoso: o cast da Operación Triunfo revela-se ser extremamente problemático (como os espanhóis amam!) e extremamente diferente do pãozinho-sem-sal-que-queridos-que-eles-são do ano anterior.  Sejamos sinceros, os participantes desta temporada da Operación Triunfo em tudo são superiores quando em cima de palco.

Então, quando chega o momento de escolher o representante para a Eurovisão, nada pode correr mal, não é?

"Quando deram a pior canção ao Famous"

Vamos tentar explorar desta forma: tu és um jovem de 21 anos que seguias com a tua vida aborrecida, eurodrama-free, quando foste selecionado para o programa televisivo mais bem-sucedido do país. Olhas para o TOP 40 nacional e vês Aitana, Lola Indigo, Aitana outra vez, Ana Guerra, Aitana outra vez e Alfred, e percebes que a Operación Triunfo é, muito provavelmente, a tua melhor chance para uma carreira musical. Assinas um contrato que tem em letras pequenas “Aceito ser obrigado a ir à Eurovisão, ao evento que colocou a Pastora Soler e a melhor canção eurovisiva espanhola em 10º lugar (por baixo da canção ridiculamente genérica que é "Standing Still"). Aceito ir à Eurovisão com o que me obrigarem a cantar na gala de Eurovisão”. 

Acontece que os triunfitos do ano não querem ir à Eurovisão. E os que querem ir à Eurovisão têm as piores canções. 

Ir à Eurovisão é um privilégio dado a 0.00000002% da população mundial (fiz as contas!). Não há nada que chegue aos calcanhares da audiência da Eurovisão (sim, a toxicidade-masculina-disfarçada-com-Lady-Gaga Superbowl incluída). O que pode passar na cabeça de um jovem de carreira inexistente para não querer aproveitar-se destes números? 

Digo-vos, se eu fosse um triunfito, fingia entrar em coma no dia da Gala da Eurovisão.

Os participantes da Operación Triunfo não são ingratos. Toda o contexto onde se encontram é agudamente problemático. Mesmo que as canções escolhidas pela TVE fossem todas ao nível de “Quédate Conmigo”, existem razões compreensíveis pelas quais recusar ir à Eurovisão faria todo o sentido.

"Pensando como cair do palco e fingir que foi acidente"

Quem ganhar a gala da Eurovisão no domingo será amaldiçoado com um fator: a primeira canção do seu reportório, a sua apresentação ao mundo, não será o produto da sua identidade como artista porque o “vitorioso” não escolheu um único acorde da canção e passa 3 minutos a cantar sobre marcha-atrás. 

A canção poderá ser, para um dos triunfitos, a canção que marca a sua carreira (se flopparem no resto da vida, claro), a canção com que vão ter de fechar todos os concertos. Agora esta oportunidade, que parecia ser o ponto de viragem para uma pessoa que queria uma carreira na indústria musical, tem o potencial de ser um percurso mal traçado.

Ninguém tem de sentir o tóxico conceito de patriotismo que é impingido à força militar. Recusar representar o país num programa televisivo para todo o globo não pensar que a tua carreira será baseada em onomatopeias pouco inspiradas ou reggaetons que só existem para faturar nas costas do sucesso de outras canções virais, é perfeitamente normal. 

Mas os triunfitos não podem recusar. 

"Bem-vindos à gala da Operación Eurodrama!"
Agora temos um problema: os espanhóis vão votar na melhor canção para ir à Eurovisão, mesmo que os seus representantes sejam piores que o “Não Sei Como Conseguem Ouvir Esta Porcaria De Música” Sobral, ou vão votar nas únicas duas pessoas que querem ir para Telavive? 
Se eu fosse espanhola, rezava já 3 Pai-Nossos. 

Sabem qual é a solução? Voltem a dar ao mundo a bênção que foi o Objetivo Eurovisión. Uma seleção nacional de artistas que querem ir à guerra (ou outra analogia que inclua socar os jurados quando a Mirela não ganhar).

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