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[Crónica] ESC 2018: "é um orgulho saber que fomos um país capaz"


Entrei no Crónicas de Eurofestivais em 2013. Era fã “a sério” do festival há coisa de 3 anos e estava no 2º ano do curso de Jornalismo. Era impossível não imaginar a conjugação destas duas coisas quando me questionavam acerca de objetivos para o futuro. Este ano fui privilegiada com essa oportunidade, e sim, continua a não parecer real – ganhámos mesmo a Eurovisão em 2017?! Uma semana após terem terminado aquelas duas semanas, digamos, pouco comuns, e ainda com uma mala de viagem por desfazer, fica a tentativa de fazer um resumo das mil coisas que vão na minha cabeça sobre a Eurovisão 2018. 


Se há coisa que detesto na Eurovisão é haver um vencedor previsível, mas é fácil superá-lo quando o previsível é bom. A verdade é que fiquei a acreditar mais numa vitória do Chipre do que de Israel após as semanas de ensaios. Tal como fiquei à espera que a Rússia ganhasse em 2016, fiquei à espera que Eleni Foureira, que conseguiu passar de um 21º lugar para um 1º durante as semanas de ensaios, o fizesse este ano – se bem que o drama pós-eurovisivo não teria um terço da intensidade, o que tirava todo o sumo da Post Eurovision Depression. Ainda assim, foi previsível por ser o claro favorito ao longo dos últimos meses. O primeiro impacto da canção de Israel é tremendo, e a vitória é o reflexo disso. Todo o conceito de “Toy” é maravilhoso, merecedor da vitória, e poder ver o desconforto de Salvador Sobral a entregar o troféu a Netta Barzilai, que, segundo palavras suas, tinha uma canção “horrível”, foi o crème de la crème de todos os eurodramas da temporada. Quanto à organização do ESC 2019, apenas tenho a dizer que Kiev 2017 foi só um ensaio para o erguer de um festival num país problemático.


Toda esta edição da Eurovisão foi marcada por plot twists que se fossem contados há uns anos ninguém acreditaria. Ainda é engraçado pensar que todos ficámos assustados quando percebemos que teríamos superpotências supostamente imbatíveis como a Ucrânia, a Rússia, a Suécia, a Roménia e a Austrália todas juntas na mesma semifinal. Acontece que a Rússia e a Roménia (a quem se pode juntar o Azerbaijão) deixaram de ser superpotências imbatíveis e isso faz-me pensar que a qualidade e o talento ainda conseguem sobressair-se num concurso que os velhos do Restelo teimam a chamar de político e favorecedor dos que têm melhores vizinhos. Acontece também que o verdadeiro bloodbath acabou por ser mesmo a outra semifinal, onde acontecesse o que acontecesse era impossível escolher apenas 10 canções merecedoras da final. Não foi fácil pensar que não iria ver a Bélgica, a Bielorrússia e principalmente a Grécia (uma canção cheia de elementos caraterísticos gregos traída pelo seu staging) na final, muito menos pensar que mediocridades como a Irlanda, a Lituânia e a Albânia, países do meu bottom 10 pessoal, estavam a ocupar o seu lugar. Faz-me concluir que as pessoas já não estão habituadas a intérpretes espetaculares que não tenham de abafar a sua própria voz com as vozes do coro e que a fórmula para o sucesso é colocar um casal hetero e um casal gay em palco. 


Mas há plot twist mais maravilhoso do que a passagem à final da Moldávia e da Sérvia? Dois países que sempre estiveram no fundo das apostas durante estes últimos meses, mesmo quando ambos tinham canções que se destacavam de todas as outras à sua maneira. E acredito que foi mesmo a individualidade destas propostas que as levou a ter um resultado melhor do que o esperado. A Sérvia, em vez de optar pelo truque de repetir a fórmula vencedora do ano anterior e ainda acrescentar o romance à coisa (sim, estou a falar da Espanha, o flop mais apetecível) percebeu também que seguir o pop sensação de Borislav Milanov não era a melhor opção, pois ele pode ter dado à Bulgária o seu melhor resultado de sempre mas também deu à Sérvia um dos seus maiores fracassos (ainda não superei o staging péssimo de "In Too Deep"). Trazer de volta os sons balcânicos ao festival foi o melhor que podiam ter feito, e ainda que um 19º lugar na final não seja uma coisa extraordinária, ser o finalista chocante da segunda semifinal foi a maior prova de que valorizar a música tradicional  é preferível em vez de recorrer a compositores de sucesso e/ou suecos por achar que isso é uma garantia de sucesso.


Por outro lado, a Moldávia, tida por muitos como a canção mais azeiteira e antiquada do ano, destacou-se por ter uma apresentação em palco maravilhosa, e por ser uma proposta que prova que o mundo tem saudades de quando havia países que não levavam a Eurovisão tão a sério. Sim, tenho saudades de joke entries e o top 10 da Moldávia prova que não sou a única. Os Sunstroke Project já tinham surpreendido tudo e todos em 2017 e "My Lucky Day" foi uma repetição inteligente e matreira da fórmula. Nada menos era esperado de uma canção de Philipp Kirkorov, que tem tanto de ódio em cima como de canções eurovisivas de sucesso.

Como Eurovisão sem ver favoritos a levar um pontapé no rabo não é Eurovisão para mim (tenham em conta que a França era a minha favorita em 2011, é a esse tipo de flops a que estou habituada), bastou usar um simples pin dos Madame Monsieur para que a miséria de 2011 se repetisse este ano. O casal mais dreamy de sempre, tinha uma mensagem fantástica, mas que apenas era transmitida se todos os milhões de espetadores colocassem a letra no Google Translate. A Itália, por outro lado, tinha uma mensagem igualmente fantástica, que foi transmitida da única e melhor forma possível. Esta é, talvez, a única atuação que eu poderei ver vezes sem conta sem nunca parar de ficar sem chão. Fechar o festival com "Non Mi Avete Fatto Niente" foi o murro no estômago mais perfeito possível - não, mais perfeito ainda era mesmo um murro na cara dos júris que os colocaram em 17º lugar.


Parece-me errado não falar da canção portuguesa, mas confesso que nem me lembrava de que tínhamos participado. A simplicidade d'"O Jardim" não se destacou num festival cheio de canções excelentes. A letra continua a ser belíssima, a interpretação continua a ser competente, mas não é uma canção suficiente para o festival. Não acredito que fosse uma canção finalista caso Portugal não fosse o país anfitrião, mas nem tudo é mau! O que tivemos a menos na nossa representação, tivemos a mais na organização da Eurovisão. Tivemos um palco maravilhoso (LEDs, para quê?), tivemos as melhores apresentadoras que podíamos pedir, um grafismo fantástico, uns postcards que deram a conhecer o que este país tem de melhor. É um orgulho saber que fomos um país capaz. Não deverá repetir-se tão cedo, mas é bom saber que conseguimos organizar uma Eurovisão excelente.


Curiosamente, apesar de ter sido a primeira Eurovisão a que assisti ao vivo, foi a primeira final que não assisti com grande entusiasmo ou nervosismo. Por ter assistido aos ensaios, isso implicou que no dia 12 de maio estivesse a assistir pela 11ª vez à maior parte das atuações. Se, por um lado, ser jornalista acreditada no festival me deu todos os privilégios e mais alguns, por outro a Eurovisão deixa de ter a magia e o fator surpresa que tem todos os anos. "La Forza" era a minha canção favorita este ano mas na final não me deu pele de galinha como no primeiro ensaio. A coreografia incrível da "Fuego" já me parecia banal. Aquela quebra fantástica na "Hvala, ne!" perdeu metade da graça. Isto para não falar do facto de a Eurovisão ser um espetáculo para se ver na televisão e não numa arena - afinal de contas, enquanto em casa viam Saara Aalto às voltas, nós na Altice Arena não viamos nada. Adorei cada momento da Eurovisão de 2018, e doeu no coração ver os cartazes a ser retirados das ruas de Lisboa na manhã do dia 13 de maio, mas mal posso esperar por ver a edição de 2019 no conforto do meu sofá com o meu cão ao colo. 

Imagens: Zimbio, Metro/Vídeos: Eurovision.tv
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  1. Gostei muito de tudo que escreveu, à exceção sobre a mediocridade da Albania. Sorry, mas a canção não é medíocre (procure a tradução em inglês ou assista ao vídeo onde Gent explica do que se trata a letra) e a interpretação é fantástica. Grata pela atenção.

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