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[Crónica] ESC 2014: final da Eurovisão - por Elizabete Cruz


A noite em que a discriminação não levou a melhor.

Este foi, para mim, um ano um pouco azedo, pelo simples facto de que não tive a possibilidade de acompanhar as semifinais. Quer dizer, já é duro o suficiente que este espectáculo ocorra apenas em três dias do ano, para mim este ano foi apenas um. Por isso, todo o encanto das semifinais se perdeu, para mim, porque tive que ver mais tarde tudo no Youtube. Ainda assim, e apesar de tudo, este foi um ano com um gostinho especial para mim, porque foi um ano em que fiz uma fã eurovisiva do outro lado do oceano, que acompanhou e delirou comigo durante a final. No final só me disse "obrigada por me teres apresentado a Eurovisão". Podem criticar a Eurovisão quantas vezes quiserem, mas este é um espectáculo que une pessoas e, como fã eurovisiva que sou, é impossível não achar que isto vale mesmo a pena.


Falando agora do espectáculo propriamente dito, tenho a dizer que certamente superou as minhas expectativas. A começar pela arena, que inicialmente ameaçava ser horrível, e a acabar nas músicas, que não pareciam nada de especial, a verdade é que tudo acabou por ser bem mais surpreendente do que aquilo que eu esperava. O palco permitiu uns efeitos visuais fantásticos, apesar de em alguns momentos o ter achado um pouco claustrofóbico. Mas o que é certo é que muitas prestações foram extremamente favorecidas pelo palco e pelos efeitos, que foram dos melhores que vi nos últimos anos. Ponto positivo também para os postcards. Foi original terem pegado naquilo que representa cada país e usarem para fazerem a bandeira e, quando tal não era possível, terem arranjado uma maneira de dar a volta ao assunto sem se tornar algo banal. Em relação aos apresentadores, tirando o erro com a canção portuguesa, não tenho nada a apontar. Competentes, tal como se pedia. Achei, no entanto, curioso que na altura da entrega dos pontos, fossem dois homens a ficar no palco, e não um homem e uma mulher, como seria de se esperar. Pode ser só interpretação minha, mas vejo até aqui uma mensagem de tolerância e de não discriminação, ou não fosse a Dinamarca um dos países mais liberais do mundo. 


Apesar de na altura das finais nacionais, não haverem muitas músicas que eu achasse geniais, a verdade é que a minha opinião foi mudando com o tempo. Há muita música deste ano que pretendo continuar a ouvir. Mas vamos primeiro a Portugal. Não é novidade para ninguém que nunca fui fã desta música. Mesmo assim, sei reconhecer o trabalho realizado pela delegação portuguesa, que se esforçou por tornar uma música que de si não tem grande qualidade em algo que pudesse marcar a semifinal que estava. Era difícil, todos nós sabíamos, por estar na semi dos grandes monstros eurovisivos, mas chegou a um ponto em que eu acreditei que passaríamos. Se foi justa a não passagem? Mais uma vez refiro, não era um tema propriamente com qualidade, mas outros que passaram também não eram. A Europa queria Portugal na final, e o balde de água fria não foi só para nós, portugueses. Portanto, não, não considero justo não estarmos nesta final. Mas este já costuma ser o nosso azar, portanto é esperar que quem venha para o ano faça um trabalho ainda melhor.


Há músicas pelas quais nada dava que realmente me surpreenderam. Uma delas foi sem dúvida a música da Ucrânia, que eu odiei desde o início, e que basicamente só me convenceu na semifinal. Claro que a música continuava a ser extremamente vazia de conteúdo, mas Mariya tornou este tema em algo audível e até agradável ao defendê-lo da melhor forma possível. Claro que todo o cenário montado ajudou bastante, sendo sem dúvida um dos mais bem conseguidos. Também a Suíça me surpreendeu, muito, e me deixou extremamente orgulhosa, por ser o país onde nasci. Acho que foi a primeira vez que vi a Suíça a aproveitar bem um palco para fazer um bom espectáculo. Para além disso, Sebalter demonstrou-se bem melhor que na final nacional e conquistou-me com a actuação na semifinal. Na final segurou um bom lugar, e deixou o meu ego mesmo feliz. 


Depois existem aquelas músicas que foram exactamente o que eu esperava delas. Carl Espen brilhou e continua para mim a ser um dos melhores da edição. Sanna Nielsen esteve igualmente muito bem, defendendo uma música da qual aprendi a gostar com o tempo. András Kállay-Saunders chegou às semifinais como meu preferido e aí decaiu no meu top, mas continua a ser uma das minhas preferidas. Impossível ficar indiferente àquela interpretação e à própria temática da música. Os Freaky Fortune foram uma desgraça a nível de resultados, mas continuo a amar a prestação deles. Não é qualquer música que me põe aos saltinhos feita doida no sofá. Basim animou toda a arena e todas as pessoas em casa, com aquela música orelhuda pela qual me apaixonei de início. E por fim, os Softengine deram exactamente o espectáculo que eu esperava deles. A proposta mais rock e uma das que mais beneficiou com os efeitos visuais, aliada ao facto de ser uma excelente música.


Por fim, as desilusões. A Irlanda foi uma delas, tendo em conta que era uma das minhas músicas preferidas. Infelizmente, era uma música demasiado boa para a voz que a acompanhava. A Itália juntou-se ao lote, apesar de não ter sido propriamente uma desilusão. Já tinha visto vídeos da Emma a cantar esta música e constatado que ela apresentava sempre alguma dificuldade. Gosto muito da Emma, mas já esperava um deslize destes. O Azerbaijão foi outra desilusão para mim, talvez a maior. Apaixonei-me por aquela música à primeira audição e esperava um grande resultado de parte dela. Mas aquela prestação em palco foi extremamente pobre. Nem sei como me conformar acerca desta música. E por fim, apesar de não poder chamar de desilusão, tenho a França. Não me surpreende o último lugar, nem digo que não merecia, mas tornou-se um guilty pleasure e doeu um bocadinho ver apenas dois pontos para o país. E depois há as desilusões com aqueles que estavam na final e nem lá deviam estar. San Marino? Os meus ouvidos não devem ter ouvido a música de igual forma que o resto da Europa. E a Polónia? Bem, é melhor nem dizer o que acho da música, para não ser desagradável.


E, claro, a música vencedora. Conchita Wurst foi a grande vencedora da noite e levou o troféu para casa. Mas não foi um troféu que ela ganhou. Ela ganhou a hipótese de se mostrar a uma Europa preconceituosa e provar que não quer saber dessas pensamentos mesquinhos. Ela é o que é, cada um é o que é, e ninguém deve ter vergonha de se mostrar. Sim, a Conchita é apenas uma personagem, por trás dela existe um Tom, mas a "Mulher Barbuda" veio abrir mentalidades e provar que na hora de se mostrar talento não se importa se se é uma mulher com barba ou um homem com mamas. Com o dom da voz, Conchita arrasou com todos os comentários maliciosos e provou ser a melhor e merecedora da vitória. Esta era uma música que estava já no meu top no início e que me fez arrepiar na semifinal. Ainda agora arrepia. Sem dúvida, a melhor performance, aquela que mais me tocou, e aquela que me fez dizer imediatamente "Meu Deus, isto tem de ganhar!". Não, não sou inocente ao ponto de dizer que Conchita venceu apenas pela música. A imagem ajudou. Até a Rússia, com tanta polémica, ajudou. O que é certo é que o triunfo foi para a Áustria.



E, para finalizar, recordo um dos momentos que mais me comoveu nesta final. Emmelie de Forest subiu ao palco e interpretou brilhantemente "Only Teardrops" e "Rainmaker". Nesta última, os vários representantes de cada país subirem ao palco, juntamente com as suas bandeiras, e cantaram e dançaram a música. Sabem aquela história da Europa unida? É nestes momentos que vejo a Europa unida pela música. Com ou sem divergências, estamos todos ali, cantamos todos a mesma música e naqueles minutos ninguém pode estragar isso. E repararam que a Conchita estava a dançar justamente junto às gémeas da Rússia? Pois é, em palco não há estas polémicas que estragam um espectáculo lindo. Não há comentários preconceituosos, não há guerras entre países vizinhos, não há países ricos, pobres, fracos ou pobres, hão há júris que são injustos a dar pontos e telespectadores que não sabem votar. Em palco somos um só, e somos aquela Europa unida para a qual este concurso nasceu. 

Encontramo-nos em Viena!

21/05/2014
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  1. Gostei, particularmente, do parágrafo final (a interessante e premente referência ao momento protagonizado em palco ao som do "Rainmaker" da Emmelie de Forest).

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