1976: A saída podia ter sido uma solução
Após outro mau resultado em 1975, a RTP decidiu apostar mais uma vez no Festival RTP da Canção – desta vez intitulado “Uma Canção para a Europa”, seguindo os mesmos moldes da seleção britânica. Por essa razão, a décima terceira edição seria uma novidade: seriam apresentadas oito canções, mas o intérprete já havia sido escolhido. Carlos do Carmo era o sortudo que iria cantar os temas no dia 22 de fevereiro, no São Luíz, em Lisboa. A música seria escolhida pelo público e não pelo júri, numa votação que aconteceu durante os oito dias seguintes ao da apresentação do dia 22. As pessoas votavam por boletins publicados na imprensa diária e que eram depois enviados à RTP. Só no dia 7 de março é que se soube que música saiu realmente vencedora. No total, a RTP recebeu 133 propostas.
Vitorino de Almeida, Ana Zanatti e Eládio Clímaco foram os novos apresentadores da edição, Herlander Peyroteo o realizador, Thilo Krassmann o director musical e a Orquestra Ligeira da Radiodifusão portuguesa fez uma participação especial.
Canção nº 1 – “Onde é Que Tu Moras” – Carlos do Carmo
Canção nº 2 – “Estrela da Tarde” – Carlos do Carmo
Canção nº 3 – “Os Lobos e Ninguém” – Carlos do Carmo
Canção nº 4 – “Novo Fado Alegre” – Carlos do Carmo
Canção nº 5 – “No Teu Poema” – Carlos do Carmo
Canção nº 6 – “Maria-criada, Maria-senhora” – Carlos do Carmo
Canção nº 7 – “Cantiga de Maio” – Carlos do Carmo
Canção nº 8 – “Uma Flor de Verde Pinho” – Carlos do Carmo
Um dos objetivos fulcrais desta nova edição era dar voz ao público na hora da votação. Nuno Martins, um dos responsáveis pelo Departamento de Programas Musicais da RTP, afirmou que os moldes deste ano ainda foram mais além dos da seleção britânica. Em relação à escolha de Carlos do Carmo, o mesmo frisou que “ele concentrava um certo número de qualidades necessárias, qualidades técnicas” para a Eurovisão.
O júri é que escolheu as oito músicas a concurso. Nuno Martins garantiu que o mesmo, composto por 14 elementos, estava todo ligado à área musical e à da criação. Apesar de quatro músicas terem visto o seu nome original alterado, a curiosidade era muita junto dos telespetadores. Além do facto de todo o processo de escolha ter sido bastante discreto, as pessoas não sabiam nada sobre os autores e compositores das canções.
Estes foram descobertos antes do tempo pelo jornal O Dia, e aí toda a dúvida popular sossegou-se, por verem nomes conhecidos como Ary dos Santos, Tozé Brito e Paulo de Carvalho na lista. A título de curiosidade, uma das canções mais populares de Carlos do Carma, “Lisboa Menina e Moça” foi recusada pelo júri. Em relação a apostas sobre canções candidatas a vencer, o Diário de Notícias (DN) considerou que a escolha recairia entre “Estrela da Tarde” e “Uma Flor de Verde Pinho”, fazendo uma página só com as letras das canções a concurso.
No dia seguinte à apresentação das oito canções, o DN publicou na sua capa que a escolha musical era “difícil”. Fazendo elogios à “seriedade profissional” de Carlos do Carmo, o programa não deixou, contudo, de ser banal.
Já a Plateia foi pedir opiniões a nomes importantes da cultura portuguesa, utilizando para isso quatro páginas. A maior parte deles (como, por exemplo, Valério, Eduardo Damas e Gabriel Paião) considerou o festival muito monótono, criticando severamente a escolha interna do intérprete e considerando Carlos do Carmo um cantor “triste e melancólico”, com pouco interesse para o tamanho que a Eurovisão adquiriu. No entanto, havia outras opiniões que consideraram que esta escolha interna afastava a “bagunça” e a polémica de anos anteriores entre as editoras, artistas e admiradores, como afirmaram Paulo de Carvalho, João Lopes e Leonel Silva.
Mesmo assim, a mesma revista considerou o festival “agradável, com o único senão de ter sido muito curto”, apesar da qualidade musical. A segunda página foi aberta com uma grande imagem. Além disso, num artigo de opinião redigido por João Araújo considera que um dos maiores inconvenientes do festival foi ter a sonoridade fado em quase todas as composições.
O Século destacou o facto de os operadores de câmara não terem tido a necessidade de filmar as personalidades que estavam na plateia e elogiou a qualidade dos apresentadores. Já a Carlos do Carmo só foram feitos elogios: “excelente dicção a que nos habituou, voz clara, musical, e o estilo que ele tem e é muito seu. Isto é de qualidade”.
Carlos, em entrevista à Plateia, admitiu que tinha noção do que lhe estava incumbido fazer e de que gosta de coisas difíceis: “Em termos portugueses, creio que há qualidade. Em termos de Eurovisão já é tudo diferente… O certame é um concurso de compra e venda, um leilão de cantigas onde há grandes interesses em jogo, fatores de ordem negativa”. Por causa desses fatores, Carlos do Carmo esperava um mau resultado, pelo facto de “não estarmos no circuito económico”.
Antes de se dar o grande evento eurovisivo, que aconteceu no dia 3 de abril no Nederlands Congrescentrum, na Holanda, e que foi apresentado por Corry Brokken, os jornais destacaram, bastante, a organização holandesa. As medidas de segurança reforçadas foram um dos destaques. As forças policiais colocaram barreiras de aço e mais de 200 polícias e seguranças em redor da arena. Além disso, os artistas, supostamente, iriam ficar num hotel junto do recinto, e iriam para o edíficio por uma passagem subterrânea para ninguém os ver. No interior, havia um mecanismo que fazia com que os inspetores soubessem quantas pessoas se encontravam lá dentro e a sua identidade.
Em relação a favoritas, toda a imprensa destacou a canção britânica, que foi a vencedora, com a representação dos Brotherhood of Men. De facto, esta vitória não foi vista com bons olhos pela generalidade da imprensa, já que a consideraram demasiado comercial e sem qualidade alguma, criando assim o esteorótipo de música festivaleira que só tinha refrões repetidos. No entanto, o DN considerou que esta vitória fora a mais apropriada para o concurso.
Já em relação à música portuguesa, confessaram que a Europa nunca iria perceber a beleza e a composição musical de “Uma Flor de Verde Pinho”. A juntar a isto, Carlos Plantier, que escreveu no jornal O Século, revelou que a RTP de nada fez para promover a canção: “segundo nos informou o dr. António Sarmento Pinto, adido comercial e director do Centro de Turismo de Portugal, na Holanda, «Uma Flor de Verde Pinho» foi dada a conhecer aqui há três ou quatro dias (enquanto meia Haia já cantarolava muitas das outras composições).”
Quanto a outros concorrentes a que a imprensa deu mais relevância, temos de apontar a representante italiana, já que era filha do ator Tyrone Power e foi alvo de mais do que uma notícia unicamente sobre ela, o dueto austríaco, o cantor irlandês e a artista holandesa, apresentando uma biografia pessoal de cada um.
Como curiosidades do certame, os jornais destacaram o facto de a Turquia não ter transmitido a atuação grega por considerá-la anti-turca, e o Diário Popular (DP) pôs com letras grandes que “os holandeses não acreditam na sua canção”. Além disto, os 12 pontos franceses atribuídos a Portugal também fizeram furor na imprensa nacional, mostrando que estes estão “do nosso lado” e que nós fomos o seu favorito, desde o início.
Carlos do Carmo trouxe para Portugal o 12º lugar, melhor que o do ano anterior, mas ainda assim bastante longe do triunfo eurovisivo. Apesar de, na generalidade, todos os jornais aplaudirem a qualidade vocal de Carlos do Carmo e o trabalho da orquestra, foram feitas algumas críticas ao cantor. O Século confessou que o cantor fez com que se intensificasse o rótulo de os portugueses serem “velhos, sisudos e macambúzios”. No entanto, a Plateia preferiu criticar a RTP pela fraca promoção do tema e o júri nacional, apesar de saber que o “Eurofestival da Canção” é (…) a personificação do comercialismo”.
Depois desta edição, lançou-se a questão sobre se Portugal deveria continuar a participar no evento. Havia vários pontos de vista: O Século escreveu um título em grande a dizer “Porque concorrer para não ganhar?”; já a Plateia redigiu um artigo a explicar porque se deve participar no Eurofestival, dando o exemplo do sucesso mundial que a banda ABBA alcançou desde a sua participação no concurso em 1974. Já Carlos do Carmo considerava que a participação portuguesa deveria continuar por causa dos emigrantes, para estimular a economia dos mercados.
1977: A única vitória portuguesa do faz de conta
Mais um ano, mais expetativas criadas. Depois de, no ano anterior, ter-se começado a discussão sobre a saída de Portugal do certame eurovisivo, a RTP quis apostar, mais uma vez, na participação, realizando o XIV Grande Prémio TV da Canção 1977, que teve lugar no dia 12 de fevereiro no Estúdio 1 da RTP, em Lisboa. Este Festival teve como nome “As Sete Canções”. É verdade: uma das novidades deste ano foi o facto de apenas sete canções terem estado a concurso, mas com 14 interpretações. Ou seja, dois cantores iriam cantar uma só canção – e a melhor interpretação da melhor canção ganharia. Foram recebidas 170 propostas.
O festival foi realizado por Luís Andrade e produzido por José Nuno Martins, com a orquestração de José Calvário. A apresentação ficou a cargo de Herman José (que foi descrito na imprensa como o Senhor Feliz) e Nicolau Breyner (Senhor Contente), que ditaram um texto escrito por César de Oliveira.
Antes da transmissão do dia 12, a RTP mostrou diariamente as músicas a concurso, uma por dia, entre 4 a 10 de fevereiro. Aliás, a votação foi aberta no dia 4 desse mês e estendeu-se até ao dia 18. No dia 26 de fevereiro, depois de todos os votos em boletins terem sido contados, a música vencedora seria apresentada.
Canção nº 1 – “Portugal no Coração” – Os Amigos e Gemini
Canção nº 2 – “Canção Sem Grades” – Teresa Silva Carvalho e José Freire
Canção nº 3 – “A Flor e o Fruto” – Fantástica Aventura e Conjunto Maria Albertina
Canção nº 4 – “O Que Custar” – Green Windows e Quarteto 1111
Canção nº 5 – “Rita, Rita Limão” – Green Windows e Cara ou Coroa
Canção nº 6 – “Férias” – Grupo Férias e Paco Bandeira
Canção nº 7 – “Fim de Estação” – Vera e Carlos, e Bric-à-Brac
Destaca-se o facto de estarem menos composições a concurso e mais estreantes a participar. José Nuno Martins classificou as canções como “muito vivas, muito alegres”. Aliás, a Plateia concordou com esta opinião, afirmando que as músicas “cerimoniais” foram postas de lado, para entrarem em seu lugar as mais alegres, incentivando à evolução da música portuguesa. No entanto, a par disto, fez críticas ao mau gosto que os artistas deram às suas atuações, principalmente com as vestimentas.
No entanto, nem todos partilhavam da mesma opinião. Alice Vieira, no DN, descreveu as canções como “terríveis, fúnebres, tontas”, interrogando-se: “que mal fizemos para semelhante castigo?”.
Apesar de Os Amigos terem vencido com a música “Portugal no Coração”, de Ary dos Santos e de Fernando Tordo, não tiveram quase nenhuma visibilidade na imprensa nacional. Aliás, esta dedicou-se mais a escrever artigos generalistas, quando se aproximavam as datas dos festivais, e de como o Festival da Canção não tinha qualidade alguma.
Os Amigos sempre disseram que no Festival Eurovisão da Canção iriam cantar para os portugueses, e não para os estrangeiros. O certame, este ano, iria acontecer no dia 7 de maio, no Wembley Conference Centre, em Londres, um espaço com 2700 lugares. A gala seria apresentada por Angela Rippon. Portugal iria atuar na oitava posição, entre 18 candidatos.
A música portuguesa esteve envolvida em várias polémicas, a maior parte delas criadas pela organização. O chefe do departamento de espetáculos ligeiros da BBC, Bill Cotton, andava preocupado por a música portuguesa se referir “às novas liberdades”, declarando que as políticas se tinham infiltrado no certame, uma vez que a letra fora escrita por Ary, um comunista assumido. No entanto, este mesmo havia estado presente em quase todos os festivais, por isso a imprensa nacional não entendia o porquê de a BBC se ter preocupado só nesta vez. Ary defendeu-se, dizendo: “a nossa canção é sobre morrer pelo seu país e renascer novamente em liberdade”.
No entanto, a Áustria também foi criticada por ser representada por camponeses de Schwetterlinge, que também tinham tendências esquerdistas. No entanto, estes confessaram não fazer manifestações políticas no dia do festival, acalmando toda a audiência.
Aliás, este foi, até àquele momento, considerado o ano mais polémico de sempre da Eurovisão. Além das ideologias de esquerda que as músicas portuguesa e austríaca apontavam, os trabalhadores ingleses da rádio e televisão fizeram greve, e desconfiou-se de que a Inglaterra, que liderou metade da votação e que acabou por ficar em segundo lugar, comprara a vitória eurovisiva.
Numa audiência calculada em quinhentos milhões de telespetadores, continuou a ser o júri, constituído por onze pessoas representativas da opinião pública do seu país, a ditar o vencedor do festival. Esta sorte calhou a Marie Myriam, que cantou “L’ Oiseau Et L’ enfant”, da autoria de Joe Gracy e Jean-Paul Cara. Na generalidade, as músicas deste ano foram consideradas razoáveis, sem roçar o exagero e sem perturbar o ouvido.
O 14º lugar que Os Amigos conseguiram, apesar de a banda ter sido elogiada, quase foi ignorado pela imprensa nacional, que deu mais importância à luso-francesa que vencera o festival. Muitos jornais consideraram esta vitória a primeira de Portugal, mesmo não o sendo. No entanto, as principais críticas feitas à representação portuguesa dirigiram-se mais a José Calvário, por ter imprimido um estilo mais rápido à música, dando-lhe um ar mais funky.
Apesar de a música vencedora ser um hino à paz e uma típica canção francesa, a imprensa, na sua generalidade, pôs em causa que ela teria questões políticas, já que em quase todas as canções deste ano houve esse problema – aliás, o DP faz um título a dar entender isso mesmo: “A «costela» da emigrante em França pagou «as favas» da comunidade europeia da canção”. Além disso, a imprensa londrina publicou uma notícia a mencionar que “L’ Oiseau Et L’ enfant” seria um plágio da película “Sacoo e Vanzetti”, composta por Enrico Morricone e interpretada por Joan Baez.
1978: a primeira canção feita nitidamente para a Eurovisão
Depois da primeira e única, até agora, vitória portuguesa no certame, segue-se 1978. A RTP apostou, uma vez mais, no concurso que estava já na sua décima-quinta edição. O Festival RTP da Canção, intitulado “Uma Canção Portuguesa”, teve lugar no dia 18 de fevereiro no Teatro Villaret, em Lisboa. Este ano, como acontecia sempre, houve surpresas: só havia três intérpretes, José Cid, Gemini e Tonicha. Todos eles, que já andavam nestas andanças dos festivais e que eram bem conhecidos do público em geral, foram bem recebidos pela crítica. Em relação aos temas recebidos, à RTP chegaram 161 propostas.
Um júri especializado e composto por 11 elementos avaliou as canções finalistas e as interpretações em direto, numa emissão onde atuou a conhecida Elis Regina. Os apresentadores de serviço foram Eládio Clímaco e Maria José Azevedo, jornalista açoriana.
Canção nº 1 – “O Meu Piano” – José Cid
Canção nº 2 – “O Circo e a Cidade” – Gemini
Canção nº 3 – “Pela Vida Fora” – Tonicha
Canção nº 4 – “Porquê, Meu Amor, Porquê?” – José Cid
Canção nº 5 – “Tudo Vale a Pena” – Gemini
Canção nº 6 – “Um Dia, Uma Flor” – Tonicha
Canção nº 7 – “O Largo do Coreto” – José Cid
Canção nº 8 – “Ano Novo Vida Nova” – Gemini
Canção nº 9 – “Canção da Amizade” – Tonicha
Canção nº 10 – “Aqui Fica Uma Canção” – José Cid
Canção nº 11 – “Dai-li, Dai-li Dou” – Gemini
Canção nº 12 – “Quem Te Quer Bem, Meu Bem” – Tonicha
Houve outras novidades nesta edição. Primeiramente, o quadro classificativo, pela primeira vez, desapareceu. Depois, não houve orquestra ao vivo, usando-se assim o playback instrumental.
Um dos maiores insólitos, e aquele que mais os jornais noticiaram, foi o facto de Fátima, membro dos Gemini, ter sido operada na semana anterior ao Festival ao apêndice, e assim não poderia movimentar-se da maneira a que os Gemini já tinham habituado os telespetadores.
“Dai-li, Dai-li Dou”, da autoria de Carlos Quintas (letra) e Vítor Mamede (música), e orquestrada por Thilo Krassman, foi bem recebida depois da vitória. Aliás, Tó Zé Brito, em entrevista à Plateia, confessa que Portugal poderá obter a melhor posição na Eurovisão com esta participação, por considerar a música muito festivaleira.
No entanto, Alice Vieira, a crítica habitual destes certames, considerou todo o espetáculo uma “desoladora pobreza”, “sem grandes histórias, sem grandes festivais publicitários, em cenário despido de efeitos”, descrevendo a música vencedora como estando “longe de ser a melhor canção”. No entanto, considerou-a a mais comercial e, assim, a escolha mais correta para a Eurovisão, sugerindo mesmo que era a primeira canção feita nitidamente para a Eurovisão.
O concurso europeu decorreu no dia 22 de abril no Palais des Congrès, em Paris. Esta edição contou com 20 participantes e foi apresentada por Denise Fabre e León Zitrone. A nível de países, um dos grandes regressos foi o da Dinamarca, que tinha estado afastada 12 anos por não concordar com o método de votação. A orquestração das canções estava entregue a 45 músicos profissionais.
Portugal atuou em quinto lugar. Para a imprensa nacional, a música portuguesa tinha chances de vencer o certame, ou de pelo menos ficar bem classificada. Em várias críticas lia-se que já tínhamos levado canções músicas piores à Eurovisão. A Plateia, por exemplo, publicou uma entrevista a várias personalidades importantes no meio musical português, entre as quais se encontravam Simone de Oliveira e Florbela Queiroz, e, na sua generalidade, consideraram a música bastante comercial, ou seja, com potencial.
A música vencedora acabou por ser a israelita, “A-Ba-Ni-Bi”, que teve comentários díspares em Portugal. Algumas publicações, como o DP, na crónica de João Alves da Costa, afirmaram que a canção israelista é um misto de “mediocridade e beneficência”, salientando que a música de nada tem de qualidade e apenas só se deu importância ao refrão orelhudo. Outros salientaram a originalidade e a diferença que o tema tem em relação aos outros a concurso. Também houve quem não achasse nem bem nem mal, dizendo que a vitória não foi polémica, uma vez que nenhuma música a concurso tinha o perfil ideal para fazer história e vencer o certame.
Em relação a Portugal, que ficou num desastroso 17º lugar com apenas 5 pontos, os críticos disseram que os Gemini fizeram o que puderam. Não desiludiram, mas também não surpreenderam. E compararam a música portuguesa com a vencedora, alegando que as mesmas têm semelhanças notórias.
Por último, começou a iniciar-se a discussão sobre a realização do festival do próximo ano, que deveria supostamente ir para Israel. O DN comentou mesmo que, caso viesse a verificar-se algum problema em solo israelita na altura da próxima edição, devido às crises de petróleo e à instabilidade que é recorrente no país, muito da culpa seria do júri português, que atribuiu 10 pontos aos Izhar Cohen & the Alphabeta.
Como conclusão, vale a pena reforçar o facto de os anos de 1976 a 1978 terem sido dos mais fracos de sempre, até àquele instante, no que diz respeito à cobertura da imprensa sobre o Festival Eurovisão da Canção e o Festival da Canção.
1979: A inexperiente que pôs o balão a voar alto
Apesar de a música que se dizia ter sido feita especialmente para a Eurovisão ter terminado mal, em termos classificativos, a RTP não desistiu da grande festa da música. Em 1979, realizou-se o XVI Festival RTP da Canção. Este trazia mais uma mudança: ao contrário do ano passado, assistiu-se agora à inclusão de semifinais. As três eliminatórias, que tiveram lugar no dia 3, 10 e 17 de fevereiro, aconteceram no Teatro Villaret, em Lisboa, enquanto a final, que aconteceu no dia 23 desse mês, foi transmitida a partir do Cinema Monumental, também na capital. Há ainda que referir que foi a partir deste ano que o certame passou realmente a chamar-se Festival da Canção.
Fialho Gouveia e Manuela Matos foram os apresentadores das quatro galas. Os cantores foram acompanhados por uma orquestra de 31 músicos, a maior parte deles provenientes da Gulbenkian. As canções finalistas foram as seguintes:
Canção nº 1 – “Tema Para Um Homem Só” – Gonzaga Coutinho
Canção nº 2 – “Uma Canção Comercial” – SARL
Canção nº 3 – “Qualquer Dia, Quem Diria” – Concha
Canção nº 4 – “Eu Só Quero” – Gabriela Schaaf
Canção nº 5 – “Novo Canto Português” – Tozé Brito
Canção nº 6 – “Cantemos Até Ser Dia” – Teresa Silva Carvalho
Canção nº 7 – “O Comboio do Tua” – Florência
Canção nº 8 – “Quando Chego a Casa” – Manuel José Soares
Canção nº 9 – “Sobe, Sobe, Balão Sobe” – Manuela Bravo
O semanário se7e fez várias capas principais com o Festival, e ainda apresentou as suas opiniões sobre todas as músicas, à medida que as semifinais iam decorrendo. Algo ainda mais curioso foi o facto de o mesmo jornal ter salientado a questão que muitos portugueses faziam na altura: se Portugal deveria levar uma música de qualidade ou optar por uma orelhuda, que ficasse no ouvido - escrevendo, depois, um artigo sobre isso mesmo. No entanto, Villas-Boas, um dos jurados deste ano, salientou que não havia fórmula para a Eurovisão.
Ainda nesta parte das curiosidades, o se7e deu importância ao facto de Tozé Brito, que foi compositor da música dos Gemini no ano anterior, ter participado agora a solo. O artista revelou que, se por acaso ganhasse cá, iria melhorar a canção que defenderia na Eurovisão. Contudo, Tozé acreditava que tinha menos hipóteses por ter estado incluído na proposta portuguesa de 1978, e confessou que, se conquistasse o primeiro prémio no Festival, daria o seu lugar a Paulo de Carvalho.
A nível de polémicas, o se7e revelou que os apoiantes de Gabriela e de Concha tiveram mau comportamento no Monumental, o que fez com que o público que estava lá presente se pusesse contra as músicas e as próprias intérpretes. Outra delas foi o facto de José Afonso ter revelado que havia condicionamentos de mercado e políticos para uma determinada canção se apresentar ao Festival da Canção. Houve outra relacionada com o cantor Carlos Vidal, que concorreu às semifinais: parece que o cantor se atrasou duas horas a chegar aos ensaios, porque teve um acidente na Marginal. Por fim, Pedro Osório, que participou no Festival com o grupo SARL, criou logo polémica por trazer uma música com uma letra demasiado politizada. O grupo foi apupado pela audiência na final, não impedindo que obtivessem o terceiro lugar.
A final do festival sempre esteve prevista para dia 24 de fevereiro, e esperava-se que acontecesse no teatro S. Luiz. Contudo, ela foi antecipada para o dia 23 devido à impossibilidade de o teatro ceder o espaço porque estava a apresentar a peça “Dona Leonor Rainha Maravilhosamente”. Por isso, a RTP voltou-se para o Monumental. De resto não existiu mais nenhuma mudança: quem votaria nas canções era também o júri, como sempre composto por dois elementos de cada distrito, de sexos distintos.
Antes da final, as revistas, principalmente, faziam destaque aos artistas a concurso, especialmente a Concha, uma das grandes revelações do ano, e a Teresa Silva Carvalho. A passagem desta última foi, aliás, uma das grandes surpresas das semifinais. O se7e escreveu mesmo o título “Júri esquece a Eurovisão e dá o melhor a Teresa Silva Carvalho”, dando a entender que pôs de lado a classificação de músicas festivaleiras, em prol da qualidade musical.
No entanto, nem todos deixaram elogios à canção. A revista Nova Gente convidou inúmeras personalidades, como Raul Indipwo e Maria Luísa Sidónio, entre outros, para comentarem, e todos eles consideraram que a artista era fresca, só que a música e a poesia eram muito “frágeis”.
O Festival Eurovisão da Canção aconteceu a 31 de março, uma data demasiado prematura, comparada com as dos anos anteriores. A gala decorreu no International Convention Center, em Jerusalém, e foi apresentada por Daniel Pe’er e Yardena Arazi. O Correio da Manhã revelou que a segurança nesta edição foi a mais apertada de sempre, devido às ameaças da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que se seguiram à assinatura do tratado de paz Israelo-egípcio. Na arena viam-se polícias e seguranças até mesmo no telhado. Além disso, para entrar, cada pessoa precisava de ter um cartão de uma cor específica e com identificação visível.
Uma das grandes novidades deste ano foi que o Festival foi transmitido, pela primeira vez, via satélite.
A imprensa portuguesa deu destaque aos outros participantes a concurso. A canção austríaca, dinamarquesa, alemã e suíça, por ser irreverente, foram das mais badaladas. No entanto, um maior destaque era dado à representante francesa, Anne-Marie David, que estava a concorrer já pelo segundo ano. Esta afirmara que não tinha vindo à Eurovisão como turista: “Vim para ganhar!”.
Manuela Bravo foi a primeira a pisar o palco e conseguiu obter um total de 64 pontos, dando-lhe assim o 9º lugar. Algo que fez estranhar os portugueses foi o facto de a nossa canção ter sido pontuada por 13 países. Este era, a par com Tonicha, o segundo melhor lugar de Portugal até então. O jornal se7e até fez uma capa a dizer que “O balão subiu, mas não chegou à Festa da Vida”.
Por ter ficado tão bem classificada, o se7e deu conta de que as críticas do público e jornalistas, este ano, acalmaram. Quase ninguém criticou o certame nem a música que representou o país, e o certo foi que foram muitas as pessoas que festejaram até tarde esta nossa conquista, o que as impossibilitou de trabalharem no dia seguinte. No entanto, os defeitos que se apontaram foram mais ao nível musical. Discutiu-se que a edição de 1979 foi uma das mais fracas de sempre, por quase só ter músicas que ficam no ouvido. Além disso, os jornalistas foram pedir opiniões a outras pessoas do ramo, como João Maria Tudela, e todas elas, de modo geral, confirmaram que uma canção tem de ser vendida em apenas três minutos, daí a maior parte delas apostar num refrão orelhudo.
Mais tarde, após a sua participação na Eurovisão, Manuela Bravo considerou que o certame é “um mundo onde se confraterniza, onde se aprende muito”. No entanto, queixou-se das jogadas políticas: “Lembro-me de que, em 1979, havia reuniões à porta fechada para se decidir quem é que se devia promover mais ou menos. (…) Senti-me inocente entre os tubarões”.
Israel voltou a ganhar, desta vez com o tema “Hallelujah”, uma música de teor comercial e uma aposta na simplicidade, segundo considerou a imprensa. Apesar destas observações, foi uma vitória que não criou muitas polémicas. Contudo, a presença do Festival em Israel fez com que a Jugoslávia tenha optado por não transmitir a edição, por causa da guerra israelo-árabe de 1967.
Esta nova vitória do país assustou Tzvi Zlindar, diretor da principal TV israelista, por causa do dinheiro que iria despender na organização do próximo ano. Preocupava-o o facto de ter já apostado tudo na montagem desta edição. Por isso, propôs a realização do festival de 1980 à Espanha, já que considerou que o júri espanhol fora o mais imparcial de todos.
19/10/2013
Apoio oficial:
OGAE PORTUGAL - [AQUI]
Texto redigido por:
Outros colaboradores da rubrica:
Amei!
ResponderEliminar