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Em cada canção, uma mensagem - Sétima letra: O Meu Coração Não Tem Cor, de Lúcia Moniz



LÚCIA MONIZ - "O MEU CORAÇÃO NÃO TEM COR" (PORTUGAL, 1996)


Andamos todos a rodar na roda antiga
Cantando nesta língua que é de mel e de sal
O que está longe fica perto nas cantigas
Que fazem uma festa tricontinental

Dança-se o samba, a marrabenta também
Chora-se o fado, rola-se a coladeira
P'la porta aberta pode entrar sempre alguém
Se está cansado diz adeus à canseira

Vai a correr o corridinho
Que é bem-mandado e saltadinho
E rasga o funaná, faz força no malhão
Que a gente vai dançar sem se atrapalhar
No descompasso deste coração

E como é? E como é? E como é?
Vai de roda minha gente
Vamos todos dar ao pé

Estamos de maré, vamos dançar
Vem juntar o teu ao meu sabor
Põe esta canção a navegar
Que o meu coração não tem cor
(x2)

Andamos todos na ciranda cirandeira
Preguiça doce e boa, vai de lá, vai de cá
Na nossa boca uma saudade desordeira
De figo, de papaia e de guaraná

Vira-se o vira e o merengue também
Chora-se a morna, solta-se a sapateia
P'la porta aberta pode entrar sempre alguém
Que a gente gosta de ter a casa cheia
Vamos dançar este bailinho
Traz a sanfona, o cavaquinho
A chula vai pular nas voltas do baião
Que a gente vai dançar sem se atrapalhar
No descompasso deste coração

E como é? E como é? E como é?
Vai de roda minha gente
Vamos todos dar ao pé

Estamos de maré, vamos dançar
Vem juntar o teu ao meu sabor
Põe esta canção a navegar
Que o meu coração não tem cor
(x3)

Hey!
(E vai de volta, vai de volta, p'ra acabar)
Que o meu coração não tem cor

  Este é um dos meus poemas preferidos de todo o Festival da Canção. Para além de ser estruturado de forma muito tradicional possui versos muito ricos, que se identificam claramente com a cultura portuguesa. O poema inicia com duas quadras de rima alternada. As estrofes que antecedem o refrão possuem duas composições diferentes: um quinteto com rima mista (emparelhada e cruzada) e um terceto com uma repetição e rima alternada. O refrão possui uma estrutura tradicional, semelhante às primeiras quadras e às quadras seguintes. Repete-se cinco vezes ao longo de toda a canção. O poema termina com três versos livres: uma interjeição, um verso branco e um verso que transcreve o título da canção.

    Coincidentemente, uma das minhas letras favoritas levadas por Portugal ao ESC, é também uma letra que marca por uma mensagem a transmitir e que trouxe a melhor classificação do país, até ao momento, na Eurovisão: o 6º lugar.
  A letra é um constante elogio à língua lusófona e ao nosso país. O português é doce como o mel e salgado como o sal: uma ótima conjugação de sabores. A língua portuguesa chega aos três cantos do mundo: é uma festa tricontinental, pois é falada na Europa, na África e na América do Sul, aproximando aquilo que está longe. Assim, é dada uma referência a todos os da comunidade lusófona e também aos portugueses que já não se encontram a viver em Portugal. Tudo é uma junção de sabores. Também se valorizam as danças típicas desses países: no Brasil, dança-se o samba, a ciranda, a chula e o baião. Em Angola o merengue, em Moçambique o marrabenta. Em Cabo Verde, anda-se ao som da colandeira, do funaná e da morna. Porém, também há uma metáfora em relação à emigração. Os que estão longe, ao chorar de saudade, escutam o fado, que é do nosso Portugal. Quando regressam em férias, matam esta saudade nas festas das aldeias, naqueles dias de união e casa cheia, ao ver o rancho folclórico a dançar o corridinho, o vira e o malhão. Na Madeira recorda-se o bailinho e nos Açores a sapateia, ao som de instrumentos tradicionais como a sanfona e o cavaquinho.
  Esta temática está (ainda) tão adequada aos dias de hoje. Ainda há bem pouco tempo foram divulgados números assustadores de habitantes que deixaram o nosso país no último ano. A porta da emigração tem estado sempre aberta, e a cada hora entra alguém por ela. Se estamos cansados desta vida, neste nosso país tão único, mas que impossibilita a nossa evolução, temos que dar ao pé e ir dançar para outro lado. Talvez desta forma se consiga dançar sem nos atrapalharmos e dizer adeus à canseira. Quem dera a muitos não ter que deixar esta preguiça doce e boa, mas a verdade é que se quisermos navegar, não há outro remédio senão ser obrigado a sentir uma saudade desordeira das nossas origens: beber guaraná e comer papaia em vez do nosso figo transmontano.
  Enquanto o ritmo desta dança evolui, e até que não sintamos que a nossa música toca sem desafinação no nosso país, o coração de todos os emigrantes vai sentindo-se num descompasso. Para eles, e para os que ainda irão partir, o seu coração continuará a ter a mesma cor: o verde e o vermelho.


22/07/2014

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